FreakShow ou Como dar corpo a umx monstrx canibal é uma imersão estética interlinguagem sobre as possibilidades de deriva do corpo em processos contranormativos de elaboração. Este projeto fomenta a exploração do cenário “gore” (de horror) característico do circo dos horrores como plataforma para investigar as relações entre estética e perigo, a partir de um mapeamento das distribuições coreográficas de violência. Trata-se de uma investigação na busca de um exaurir o corpo, exaurir a imagem, exaurir a cena, exaurir o movimento, em busca de corpos que transcendam a norma, nomeiem a norma e desnaturalizem a norma que atua como alvo focalizador das violências diversas atribuídas ao corpo na sociedade.
O perigo é instância iminente na trajetória do artista periférico. Esse trafego constante pelo vão entre o trem e a plataforma é caminho almejado na procura subjetiva da performatividade. Artistas com pesquisas diversas dentro da área da dança trazem no bojo de suas produções essa instigação constante pelo risco em cena, seja ele concreto e fatal ou subjetivo/narrativo.
Em seus 3 anos de trajetória, a CiA dXs TeRrOrIsTaS vem desenvolvendo uma pesquisa vertical sobre potências contranormativas de gênero e sexualidade e a produção de estéticas de resistência ao colonialismo dos corpos fora do padrão. Em todo este período de imersão, sempre nos perseguiu o tema do perigo como objetivo estético e narrativo a ser encontrado.
Primeiro porque, como terroristas poéticos, nos interessa a fricção da ficção com real a ponto de gerar fraturas que tornem essas camadas indissociáveis, ao nível de que o espectador-interator veja nesse borrão estético possibilidades de desdobrar sentidos da relação com a obra para si, em um projeto pessoal estético-político-pedagógico.
Segundo porque, como periféricos, a idéia de perigo se faz constante em nossos dias: donos de corpos não hegemônicos que recebem com maior incidência a distribuição da violência humana, seja das instituições estatais, seja do imaginário fetichista cisheteronormativo branco e eurocentrado que nos coordena e coreografa diariamente para movimentos que não nos cabem.
FreakShow é um disparador que tem o universo do circo dos horrores como contraponto estético para traçar um debate sobre corpos dissidentes e a contranormatividade destes.
O termo “contranormatividade” é disputado na trajetória da CiA dXs TeRrOrIsTaS desde sua criação. Iniciamos a pesquisa em terrorismo poético debatendo as possibilidades estéticas e politicas em torno do debate da contranormatividade de gênero. Com seu primeiro projeto, DITADURAGAY, dilatamos esta pesquisa para disputar o termo nas linguagens artísticas, investigando o boxe, tricô e crochê como alguns exemplos de potenciais de linguagens contranormativas.
Agora, o desdobramento vai para o corpo. O atentado contranormativo agora vai em direção as normatividades corporais que fomentam padrões estéticos que limitam e valoram os corpos contemporâneos na cidade. Entendemos que padrões brancos, magros, cisgêneros, heteronormativos, higienizados e plastificados entram em curto-circuito quando colocado em frente ao “horror” estético do Freak, do dissidente elevado à sua maior potência expressiva. Este projeto visa a pesquisa de novas possibilidades de se inventar, construir e até negar a existência do corpo enquanto matéria qualificável. É a produção de uma utopia no corpo que se movimenta e mobiliza outros corpos para fora da norma.
Essa norma que violenta os corpos que não lhe cabem, que mata, fere e corrompe as corpas dissidentes.
Partindo deste pressuposto, FreakShow prevê encontros formativos para elaboração de ações políticas e de produção de autonomia. Esses encontros prevem a criação de linguagens em um processo hibrido de educação, arte, cultura, política e ação social.
Estética e perigo andam juntos. Viver esteticamente fora da norma é habitar as paragens do perigo, é conviver com o risco de ser “anormal” e sofrer as agressões constantes de um mundo que não está concretamente preparado para lidar com a diversidade.
Dessa forma, este projeto nada mais é do que um desdobramento destes desejos de busca por possibilidades de resistir como artistas, tanto no espaço da narrativa subjetiva, quanto no cotidiano engessado e violento que nos molda e nos faz (re)agir em nossas produções.
Urgente, preciso, contemporâneo e totalmente conectado com o modo cirúrgico de operar que pressupõe um trabalho exercido dentro de um projeto de política pública cultural.